Confiança

substantivo feminino.

  1. Sentimento de confiar, acreditar, crença no caráter e na lealdade de uma outra pessoa.
  2. esperança.

logo após sair do mar com meu rosto cheio de água para refrescar do calor, te vejo chegar, sorridente, brilhante, bonito. parecia ser gente boa. nos cumprimentamos com intimidade de quem já se conhecia, mas na realidade só havíamos conversado virtualmente.

de estatura mediana, pele preta como cacau torrado, cabelo curto e preto, sorriso aberto, entusiasmado, seus olhos brilhavam ao me ver – ou pelo menos pareciam brilhar. ficamos alguns segundos envolvidos naquele abraço que ansiamos para sentir. teu cheiro tomou conta de mim e por um instante minha mente fez um esforço para guardar aquele cheiro como memória viva em algum lugar dentro de mim. gosto de aromas.

como havíamos combinado, estendemos uma canga na areia, perto da sombra das folhas de sete copas e começamos a colocar as coisas do café da manhã com muito bom humor, risos, histórias, frutas, café, leite de coco, vida cheia de esperança e muito sol. entre pedaços de bolo de fubá com goiabada e uvas soltas, muitas trocas de olhares e palavras não ditas, mas sentidas no nosso íntimo.

ainda havia uma dúvida no ar: cachoeira ou mar?

eu como bom pisciano indeciso e amante de água, sugeri: que tal ambos? damos um pulo na cachoeira de manhã e na praia à tarde.

lavar-se em águas doces é sempre tão revigorante, e você havia me dito que fazia tempo que não ia em uma – o que deu mais sentido em compartilhar essa experiência juntos.

mesmo que tivéssemos tido dificuldade para encontrar o caminho, no fim, assim como a vida, sempre se dá um jeito de encaminhar. fizemos uma trilha gostosa e curta que dava em alguns fossos com quedas pequenas, águas geladinhas e refrescantes, assim como era prometido.

passamos a tarde na praia: o mar estava agitado e o sol já estava coberto, mas não ausente, deixando teu calor abafando tudo. sentamos em cadeiras na areia e ficamos sentindo a vida. olhando um para o outro e sorrindo. você decidiu ir ao mar, preferi te observar indo, mas pouco tempo depois me rendi e mergulhei também – mas queria que o mergulho fosse em você.

entre ondas e risadas, bocadas e braçadas em água salgada, passamos o restante do dia sendo felizes. era bom estar em sua companhia, não pareciamos nenhum pouco estranhos. estranho era não estranhar esse (des)conhecido.

finzinho do dia, voltamos para casa para descansar um pouquinho antes do evento que tínhamos combinado de ir a noite. na praça central da cidade, estava acontecendo um festival de verão com música, comida e muita gente. entre conversas e olhares, um convite: toma banho comigo?

aceitou com alegria –  e com movimentos que pareciam desejo. e pude, enfim, imergir em ti.

beijos molhados envolvidos em suor e água gelada, mãos que buscavam incansavelmente nossos corpos, tesão, vontade, suspiros úmidos, mordidas, fluidos, banho. mergulhamos em nossa própria onda de prazer.

deitamos para relaxar um pouco, ventilador no talo, calor a mil. a vontade nos matando. beijos e contatos nos trazem uma avalanche de prazer, entro em você e busco teus segredos mais íntimos. tiro uma respiração ofegante, cortada, suada e contínua. queria roubar você pra mim, romper teu eu. te encher de mim. e deixar teu quarto com nosso cheiro. explodimos.

decidimos dar uma volta no Centro para sentir a noite e prestigiar o evento. comemos acarajé e até posamos como modelos para a barraquinha. noite quente e agradável, agora estava registrada para além das memórias. tomamos sorvete, sentimos a vida vibrar no final de ano. noite de dezembro. estamos azuis com o reflexo da lua e do mar.

alongar a noite? barzinho? uma esquina de boteco com bebidas, forró, conversas jogadas ao vento, palmas, risadas, vozes, carros, movimento… a essa altura do dia éramos íntimos. beijos soltos, nuca arrepiada, assobios baixos para chamar a atenção, beijos roubados, pele eriçada, olho no olho, aqui e agora. presença.

madrugada adentro, cansaço após um dia intenso, o corpo pede arrego. decidimos ir para casa.

banho tomado e, prontos pro descanso, utilizamos nossas últimas barras de energia do dia para trocarmos mais alguns afagos e algumas palavras antes de cair no sono. assim como as ondas do mar, te senti recuar. era como se meus pés se afundassem na areia e se escondessem enquanto a maré voltava. percebi que estava reunindo coragem para me dizer algo. peguei suas mãos e comecei acariciar na esperança de deixar você relaxado. um tempo depois entre olhares perdidos e respiração funda, você olha nos meus olhos e diz:

– Você é uma pessoa tão legal, tão receptiva, me transmitiu tanto caráter… sinto que posso confiar em você, me senti seguro e gostaria de compartilhar algo contigo: sou I=I (indetectável = intransmissível)

não que precisasse, mas quis, sentiu que aquilo era importante. de alguma forma naquele mesmo instante criou-se um vínculo que verteu-se em lágrimas em meu peito e chorou, transbordou; vez ou outra ouvia-se uns soluços misturados com dor e alívio e podia sentir o quente de suas lágrimas. isso encheu-me o coração de você, não tinha como não senti-lo. apenas abraço e acolhimento, era tudo o que se podia fazer naquele momento. o amei como quem também entendia de segredos sufocantes.

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